A história dos computadores é incrível. Contudo, essa história não aconteceu sozinha. Aconteceu entrelaçada com as vidas das pessoas. Portanto, não existe a história dos computadores, sem as histórias dos homens e das mulheres que a criaram e impulsionaram.
Mas no momento não estou pensando só nas histórias dos gigantes da computação. Não estou me referindo só aos merecidamente celebrados, os famosos:
- Charles Babbage, o pai da computação, que inventou o primeiro computador mecânico,
- Ada Lovelace, a primeira programadora, que criou o algoritmo para a máquina analítica de Babbage,
- Alan Turing, que avançou a fundamentação teórica da computação e inteligência artificial,
- Steve Wozniak, que inventou o Apple I e II,
- Grace Hopper, que criou o primeiro compilador, e popularizou idéias como “bug”, “debug”,
- e dezenas de outros.
Por mais que esses sejam alicerces da computação, estou pensando menos neles, e mais em nós. Pessoas como eu e você. Nós não nos conhecemos, mas me atrevo a nos agrupar (me perdoe se me engano). Enfim, estou pensando nas pessoas que vivenciam essa evolução da computação, cada um participando dentro do seu trabalho, dos seus estudos, ou mesmo dos seus hobbies. Cada um testemunhando essa evolução, e contribuindo com seu trabalho, suas soluções, e suas próprias inovações.
Vale a Pena Recordar sua Experiência na Computação
Então, eu lhe pergunto: qual é a sua história com computadores? Você se lembra da sua primeira experiência? Certamente, se você é jovem, pode ter sido com um PC em casa ou na escola. Ou talvez um desktop ou laptop no trabalho. Ou, se você é mais jovem ainda, pode ter sido até mesmo em um smartphone ou tablet. Por outro lado, se você é como eu, já tinha feito uma boa jornada quando estes apareceram.
Que tal tirar alguns minutos para refletir: onde você se encaixa na história da computação?
Sobretudo, ao ler este post, reflita um pouco sobre sua própria história com computadores. Você lembra qual foi o seu computador preferido? O mais difícil? Com qual você aprendeu mais? Está começando agora? Trabalha no ramo há anos?
Nesse sentido, enquanto você dá uma pensada na sua história, aqui eu conto um pouco da minha própria experiência na informática.
Explore também termos da informática em Inglês e Português nos Glossários com Áudio.
Lembro Bem do Primeiro Computador que Vi
Eu lembro muito bem do primeiro computador de verdade que vi. Foi na UFRJ, na Ilha do Governador, no Rio, em mais ou menos 1978. O meu amigo Júnior cursava computação lá, e eu (com 17 anos) estava tentando decidir qual rumo seguir na vida. Ele me levou para conhecer o centro de processamento de dados e seu computador. E que computador!
Assim que chegamos, jogamos um tipo de jogo de Star Trek em um dos terminais alfanuméricos (alphanumeric terminals) – aqueles com mais ou menos 25 linhas de 80 caracteres. Para isso, precisavamos estimar o ângulo entre a posição de nossa nave e a nave dos Klingons para lançar um ataque. Tudo (nossa nave, os Klingons) era representado só por fileiras de letras e caracteres.
Logo depois, visitando as salas da UFRJ, eu via nos quadros os vestígios de programas que os professores exploravam com os alunos. Eu não tinha experiência nenhuma com computação ou programação. Mas o Júnior explicou que eles programavam em linguagens especiais como Fortran e COBOL que os computadores entendem.
Sendo gringo, me surpreendi ao reconhecer no quadro negro termos em Inglês. Fiquei impressionado com os alunos, pois, além de entenderem de computação e lógica, eles tinham que programar com palavras oriundas do Inglês. Era “GOTO”, “ASSIGN”, “CLOSE”, “SIZE”, e muitos outros, ao invés de palavras semelhantes em Português. Só muito depois fui entender como o programador mergulha corpo e alma no idioma próprio do computador.
Seguindo meu Rumo
Foi assim que, devidamente impressionado com esse novo mundo da computação, em 1979 segui meu rumo. Me mudei de Niterói para o Texas para estudar matemática e ciência da computação. Ao chegar na University of North Texas, encontrei um computador pela segunda vez. Esse era o enorme IBM 370, que a essa altura já tinha uns 9 anos de idade.
Como os outros computadores de grande porte da época, o IBM 370 usava aqueles cartões perfurados (Hollerith). Muitos alunos chegavam ao centro de computação de madrugada, cansados de programar o dia todo. Carregavam caixas de centenas de cartões perfurados para inserir no leitor. Cada cartão representava uma linha de texto do programa. Mas, ao retirá-los da caixa, às vezes os cartões escorregavam e caíam ao chão. Os cartões se espalhavam, perdendo a sequência que formava a lógica de seus programas.
Boas Memórias da Computação
No entanto, no ano seguinte, esse IBM 370 foi sucateado e trocado por um outro gigante. Era um NAS AS 9000 novinho em folha. O diretor do nosso departamento cortou em pedaços a malha de memória de núcleo magnético (magnetic core memory) do IBM 370 – o RAM da máquina. Ele presenteou cada aluno do departamento com um pedaço. Guardei meu pedaço por muitos anos. Infelizmente se perdeu em uma de minhas mudanças.
A essa altura, eu já não era mais estudante calouro. Eu já conhecia (mais ou menos) as várias tecnologias de memórias mais modernas na época. Mas poder ver, tatear, e levar para casa um pedaço dessa malha, me parecia algo mágico. Seus pequenos anéis (cores) do tamanho da cabeça de um pequeno alfinete armazenavam só um “bit” de informação cada. Apenas um 0 ou 1.
Lembra daqueles Computadores Enormes?
Pois é. Era uma vez, reinavam só esses enormes computadores, os grandes “mainframes”. Eram tão grandes que as várias partes dos equipamentos ficavam em estruturas (armações, armários) diferentes. Muitos desses gigantes ocupavam o espaço de uma grande sala toda, ou até de várias salas.
Lá no início, quando estas novas máquinas estavam sendo desenvolvidas, as estruturas que seguravam as várias partes do equipamento desses enormes computadores se chamavam de “frames” (armações, estruturas), e a estrutura principal, onde ficavam o CPU e a memória, era chamada do “main frame”. A palavra “main” quer dizer “principal”, né. (Você talvez saiba que quase toda cidadezinha nos Estados Unidos tem uma rua chamada de “main street,” que um dia já foi sua rua principal).
Então, com o passar do tempo, “main frame” virou uma só palavra, e veio a representar aquele computador gigante todo. Por isso, hoje em dia “mainframe” é o nome que damos àquela classe inteira de computadores de grande porte.
Veja só esse mainframe…
Esta foto abaixo do IBM 370 é de uma faculdade na França. Como eu estava dizendo antes, a história da computação está entrelaçada não só com a história dos grandes que as criam e avançam, mas também de todos que as operam e usam. Como esse operador na foto. Você notou o cinzeiro cheio de bitucas na mesa do lado do telefone? Isso é outra coisa que mudou com o passar do tempo. Quando eu cheguei na faculdade, as pessoas ainda podiam fumar perto dos grandes computadores. Hoje em dia, nem pensar!
Na minha curta Experiência, a Computação já estava Mudando
Na faculdade também existiam minicomputadores. Os mainframes processavam os programas em cartões perfurados em lote, um atrás do outro, todos esperando sua vez na fila. Já os minicomputadores, mais modernos, usavam tempo compartilhado para dividir o poder do computador entre os jobs de múltiplos usuários ao mesmo tempo.
Ao invés de cartões perfurados, os usuários de minicomputadores interagiam com o sistema usando terminais de vídeo com teclados.
Seja como for, sendo 1979, tive a sorte de encontrar no laboratório de computação algumas novidades. Lá conheci os microcomputadores, que haviam sido lançados em 1977. Usávamos o TRS-80 da Radio Shack, uma PET, e o primeiro Apple no mercado.
Mesmo sendo bom e útil, a certa altura o TRS-80 recebeu o infeliz apelido de “trash-80” (lixo-80). E isso foi simplesmente porque a sigla TRS da Tandy Radio Shack lembrava a palavra “trash” (TRaSh). Sempre achei isso injusto, pois na realidade não era “trash”. Mas o apelido pegou.
Diferente dos minicomputadores, que dividiam o processamento entre os vários usuários, dando a impressão que cada usuário era o dono do computador, os microcomputadores como o TRS-80 e o Apple eram realmente usados por um único usuário de vez.
Nesses anos de faculdade (1979 a 1983), portanto, senti que o cenário mudara. Quando cheguei, reinavam os mainframes. Enquanto lá, mais e mais usamos os minis, e quando me formei vários microcomputadores já eram usados em tarefas especializadas nas empresas. Senti que vivenciara uma evolução na TI, uma mudança na escala da computação, e uma descentralização.
O Primeiro Emprego depois da Faculdade
Em seguida, em 1983 cheguei ao meu primeiro emprego depois da faculdade e comecei a trabalhar com os Tandem Nonstop II, computadores tolerantes a falhas. Eles eram muito usados em aplicações financeiras, como bancos e bolsas de valores. Além disso, muitos setores do governo precisavam de computadores de alta confiabilidade.
Contudo, nosso projeto não era para um banco, ou uma bolsa, mas para a Federal Aviation Administration (FAA), a agência do governo que é encarregada de toda a aviação civil nos Estados Unidos, e que igualmente precisava de um sistema de alta confiabilidade.
Por conseguinte, esses computadores de grande porte se propunham a tolerar falhas no sistema através de uma arquitetura de redundância com o mínimo de equipamentos ou serviços compartilhados.
Seu alvo era ter um sistema sem nenhum ponto único de falha. Para tal, o sistema tinha vários processadores independentes, cada um com sua própria memória, seus discos, seus controladores, e todos os processadores eram interligados apenas por um bus de comunicação. Assim, se um processador falhasse, todos os programas que estavam rodando naquele processador eram migrados automaticamente para outros processadores.
Na Evolução dos Computadores, Não era tudo Trabalho…
A história dos computadores inclui mais do que só trabalho. Ao mesmo tempo que no emprego eu trabalhava com computadores de grande porte e tolerância a falhas, os pequenos microcomputadores ganhavam um nome melhor, e um público mais popular. Agora batizados de “personal computers” (computadores pessoais), ou PCs, os microcomputadores começaram a penetrar o mercado de aparelhos eletrônicos domésticos. Logo depois, em 1985, aproveitei um programa de incentivo na minha empresa, e comprei meu primeiro PC para uso pessoal.
Era um IBM PC AT, que também era chamado de IBM 286, porque o microprocessador era um Intel 80286. No início, o uso dos PCs em casa era principalmente como uma boa máquina de escrever, ou um simples console com alguns jogos. Eu tinha o Frogger e Solitário (Solitaire).
No Trabalho Mudei para os Minis e Micros
Nesse meio tempo, no mesmo projeto para a FAA onde por alguns anos eu programava os grandes Tandems que faziam o processamento de dados, minhas responsabilidades e foco mudaram. Agora eu focava na área do sistema que interagia diretamente com os usuários. Nessa área trabalhei primeiro com minicomputadores da Digital Equipment Corporation (DEC).
Então, o primeiro foi o DEC PDP-11. Usávamos esse mini computador como nosso ambiente de desenvolvimento. Aqui tínhamos o editor de textos, e o montador (assembler), que traduzia nossos programas escritos nas instruções da linguagem do processador para o código binário da máquina, que o processador conseguia executar. Tínhamos também o compilador (compiler) de Fortran, mas toda a parte de suporte aos terminais de usuários era escrita em assembly language mesmo.
Esse assembly language tinha o nome de Macro-11, e era uma delícia. A sensação de programar em um nível tão próximo ao funcionamento da máquina, tão pertinho ao processamento de cada microinstrução, era satisfatória demais
Nas sequências de instruções você manipulava os 8 registros do processador diretamente – os seis registros gerais (R0 a R5), mais o R6, que era o Ponteiro da Pilha de Execução. Finalmente, o R7 era o Contador de Programa, que mantinha o endereço da próxima instrução a ser executada. Quanto mais tempo eu passava no mundo desse processador, mais esses registros pareciam 8 simples gavetas em um armário no quarto, onde eu podia fazer qualquer coisa manipulando seus conteúdos.
Instalando o Software no LSI-11/23
Era muito gostoso não só programar na linguagem do processador, mas também trabalhar diretamente com o processador LSI-11/23 da DEC na instalação e execução. Esse processador tinha um EPROM (chip de memória programável e apagável só de leitura) onde armazenávamos o software que havíamos desenvolvido no PDP-11. Antes de fazer novo download de software para o EPROM, tínhamos que apagar o programa atual expondo o chip à luz de uma lâmpada ultravioleta. No EPROM cabia não só o nosso aplicativo, mas também o próprio sistema operacional que nossa equipe mesmo escreveu, além do bootstrap, que é o programa que transferia esse software todo do EPROM para a memória RAM e iniciava a execução do sistema.
Quem diria, né?
Parte da história da computação são as previsões do futuro da computação. Eu recordo ter lido uma vez que Ken Olsen, o fundador da DEC, comentou algumas vezes nos anos 70 que não conseguia enxergar necessidade alguma ou uso algum para alguém ter um computador em casa (“he couldn’t see any need or any use for a computer in someone’s home”).
Essas palavras têm sido negadas, confirmadas, explicadas e zoadas por muitos ao longo dos anos, especialmente por virem do fundador e líder de uma das maiores empresas de microcomputadores da época. Seja qual for a verdade sobre o que disse, muito poucos podiam enxergar a rapidez, e a extensão da invasão dos computadores em nossas casas.
Aqui então recordei minha trajetória com computadores do zero até mais ou menos 1987, quando eu mexia muito diretamente com os microprocessadores. Isso foi apenas o começo; meus horizontes e experiências com o mundo dos computadores continuaram a se expandir profissionalmente por várias décadas. Mas isso fica para outro dia.
Agora é a sua vez. Qual é a sua História na Informática?
Então eu volto à minha pergunta original. E você? Já traçou a sua própria história com computadores? Já se lembrou da sua primeira experiência? O primeiro era o quê? Um mainframe? Um mini, um micro, um PC, um tablet, um celular? Já pensou sobre todas as mudanças que você testemunhou, o que aprendeu, com quem trabalhou?
Às vezes é gostoso refletir sobre nossas jornadas, mesmo as tecnológicas. E a sua, como foi? O que lhe impressionou mais? O que foi o mais difícil? Por que não tenta escrever sobre a sua experiência na informática, e compartilhar com sua família e seus colegas de trabalho?